segunda-feira, 3 de agosto de 2009

A Grande fogueira

A vida é mesmo um grande mistério... Não tínhamos brinquedos, roupas, bom alimento, passeios, tv, computador, nada material... No entanto, éramos tão felizes, que seria impossível descrever. Com o passar do tempo, fui percebendo que a inocência nos torna felizes, nos protege das maldades do mundo, porem, isso quando temos o nosso próprio mundo.
E eu tinha meu mundo, ali, naquele lugarzinho, simples, cheio de pessoas reais, verdadeiras, como nunca vi igual.
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O Bom Pastor foi uma escola para mim, de amor, solidariedade e lealdade. Com meus amigos de lá e com meus pais, aprendi a doar, perdoar e confiar.
Talvez, a felicidade que sentia era justamente o fato de ali ter amigos de verdade, uns apoiando e cuidando dos outros.
Quando um amigo tinha uma obra, todos se reunião para ajudar, e o dia de colocar a laje era a maior festa, as mulheres preparavam uma comida especial, na maioria das vezes feijoada, e os homens compravam a cachaça, e depois da laje pronta, todos comemoravam comendo e bebendo.
Uma hora muito especial era as sete horas da noite, nessa hora, em que o velho radinho de pilha, o único veiculo de entretenimento, passava a hora do Brasil.
Nessa hora, todos se reuniam na rua ponta negra para acender uma grande fogueira, assar aipim, batata doce, bananas e ouvir e contar histórias de fantasmas e assombrações.
Éramos três famílias reunidas: a de dona Laurinda, com seus filhos Luciana, e Luciano e seu esposo Agenor, a de Adelaide, minha querida mãe preta, seus filhos pequenos Everaldo e André e seu esposo Oliveira, e a nossa família, eu, minha mãe, minha irmã Beth, meu irmão Alexandre, e meu pai. Também fazia parte dos componentes em volta da fogueira o Eugênio, a Lena, Vilma, Denise, e dona China, que vinham de outra rua um pouco distante, para compartilhar aqueles momentos especiais.
O Eugênio adorava bananas assadas na fogueira, e eu adorava as histórias que ele contava sobre lobisomem.
Eu tinha um instinto moleque, menino, subia em pau de sebo, entrava em terrenos proibidos pra roubar frutas, principalmente bananas, sempre roubava bananas pra presentear o Eugênio, só pra ouvir suas incontáveis histórias.
A rua ponta negra era cercada de mato e currais, não havia luz e a grande fogueira iluminava, aquecia, e ainda assava a comida.
Eu me lembro que esperava ansiosa o dia de lua cheia para ver a lua, linda, iluminando toda aquela escuridão, mas também, com a chegada da lua cheia, minha mente imaginativa viajava, eu não dormia, lembro que ficava a noite toda acordada na janela, esperando ver o ser que durante anos me fascinou e causou medo.
O ambiente ali era propicio a mentes férteis, e uma das mais famosas assombrações do local era a mula-sem-cabeça, que diziam que aparecia no curral em frente a minha casa, nas noites de quinta pra sexta, e eu ficava acordada pra vê-la, e nada...
Minha infância foi mágica e cheia de calor humano e muitas lições de vida.

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